Insustentável ternura
Escrevo Sobre as tuas mãos abertas Hoje cheias de força para agarrar o mundo Escrevo Sobre os teus olhos bons Pousados sobre mim Como dois pássaros tristes
Reflexões pessoais sobre várias coisas
Escrevo Sobre as tuas mãos abertas Hoje cheias de força para agarrar o mundo Escrevo Sobre os teus olhos bons Pousados sobre mim Como dois pássaros tristes
Não sei se é cultural ou estrutural mas quando alguém pergunta como vamos, em Portugal responde-se “Vai-se andando”.
Pensei durante muito tempo que o sofrimento era uma varinha mágica que transformava os egoístas em altruístas, os imaturos em adultos e as pessoas em verdadeiros seres humanos. Infelizmente não é assim tão simples.
Entre as muitas coisas de que o Sr. Ego vive está o queixume. Queixar-se é, para ele, uma forma de resistir ao momento presente, de dar um ar da sua graça e constantemente reafirmar a sua existência. Simplesmente aceitar as coisas como elas são é um suicídio.
De vez em quando uma batata quente vem parar ao nosso colo. Instintivamente, procuramos de imediato a quem podemos passá-la; o mesmo faz o próximo e o outro a seguir. Às vezes penso que muito do sofrimento do samsara é uma batata quente que, desde tempos imemoriais, anda de mão em mão sem nunca arrefecer.
Se há coisa que o Sr. Ego detesta é sentir-se vulnerável. Vulnerável é o mesmo, para ele, do que fraco, exposto, passível de ser humilhado a qualquer momento. Ele que se abotoa de sobretudos desnecessários e armaduras enferrujadas e quer – sempre – ter razão e levar a melhor, não suporta abrir mão da sua parafernália e sentir aquele ponto sensível, quase doloroso, bem no centro do coração.
Ora então bom ano a todos e nada de pânico com as notícias de crise que a comunicação tem um perverso prazer em nos…
Um rei tinha um vizir muito sábio, cujo sentido de justiça era muito apreciado pelo povo. Muita gente o procurava para pedir conselhos que ele dava com bondade e bom-senso. Um, particularmente, era fatídico, fosse qual fosse a situação: “Lembre-se que pode ter sido para seu bem!”.
Embora às vezes tenhamos a sensação de que não conseguimos escapar ao ego, a verdade é que a natureza de Buda está sempre por perto – ou não fosse ela a própria natureza do espírito quando não está poluído nem alterado. A dificuldade, ó balha-me Deus, é que ele está quase sempre poluído, alterado e tenso.
Sou budista há quase quarenta anos, há portanto outros tantos que oiço falar do ego. Mas, apesar disso, só recentemente a necessidade de o desmascarar se tornou absolutamente cristalina para mim.
A ideia defendida por Darwin que a evolução das espécies se baseia na competição e na rivalidade e que são os mais competitivos que sobrevivem tem os dias contados.
Vários egos a falar sobre uma questão polémica é como agitar um saco cheio de pedras: a única coisa que acontece é o choque.
Quer seja no domínio familiar ou profissional, todos os egos têm a tentação de manipular os outros, usar a força, o dinheiro, a influência ou a chantagem emocional para fazer com que se verguem à nossa vontade e preencham o nosso vazio com a sua atenção e energia.
Ego que é ego é egoísta. Ou seja, defende os seus interesses com unhas e dentes e acha-se o mais importante do mundo. A maioria dos egos, porém, não tem lata de o dizer e, quando o vê assim escarrapachado em algum sítio, acanha-se.
A culpabilidade exagerada, quase patológica, é uma das grandes pragas do Ocidente. Saber que o que fazemos “é mal”, no sentido em que pode magoar ou prejudicar alguém, é normal e desejável. Ter uma noção do que é justo e injusto é indispensável. Mas, por vezes, isso vai longe demais.